terça-feira, 22 de setembro de 2020

ERA UMA VEZ... A NOSSA PETROLÂNDIA. A QUE FOI E A QUE SERÁ por Milena Gomes

Imagem: acervo

 

Eu poderia começar esse texto explicando os conceitos de patrimônio, turismo sustentável, cultura, paisagem ou lugar. Mas eu vou falar sobre identidade local, como filha de (Nova) Petrolândia, não só pela minha formação acadêmica em Turismo e Geografia, mas pelo sentimento de pertencimento. Retirei então, da minha dissertação, um trecho em que explico o motivo de ter escolhido estudar meu município quando fiz mestrado. Gostaria de compartilhar as inquietações e não dar uma carteirada acerca do assunto para que possamos refletir juntos.

As questões das pequenas cidades, especificamente, daquelas que se acham localizadas no interior dos estados do Nordeste são levantadas, inevitavelmente, com um estereótipo de atraso, subdesenvolvimento, dependência e situação física atípica do ambiente. Sem negar a existência destas constatações precoces, o fato de ter nascido no Sertão pernambucano foi o que mais me suscitou como que uma inquietação da falsa imagem do lugar ao qual eu pertencia ser perpetuada em diversos âmbitos da sociedade.

Não fazia parte daquele lugar os retirantes maltrapilhos, a predominância de uma vegetação maltratada e seca permanentemente, nem quaisquer sinais de que existira ali uma inferioridade em relação a outras cidades e diferentes regiões.

Nova Petrolândia, onde eu nasci, é um lugar jovem. Temos praticamente a mesma idade, a nova Petrolândia é penas dois anos mais velha. Conforme eu crescia, as inquietações aumentavam, como, por exemplo, o motivo pelo qual a antiga Petrolândia teve de ser inundada em detrimento de outra sociedade. O que é diferente? Por quê?

Faziam parte das conversas em família, as lembranças da “velha cidade” a qual não conheci. Quando se referiam à antiga Petrolândia faziam-no sempre em relação ao comércio, às praças, à área urbana, uma vez que meu avô materno era comerciante. Sendo assim, eram frequentes as comparações entre os dois lugares no tempo-espaço.

O contato com o meio rural se deu sempre pela insistência do meu pai em viver da agricultura. Sendo baiano, do município de Glória, também antes atingido pela Hidrelétrica de Paulo Afonso IV e conhecida também como “Nova Glória”, de um povoado chamado “Campo Grande”, este de uma paisagem belamente caricata do sertão nordestino. Complementada por todos os laços que as férias de uma criança possam amarrar: as brincadeiras nos açudes e pelas árvores ora secas, ora cheias de espinhos ou repletas de umbu, ora comendo coalhada feita no quintal da casa dos tios. Casas estas, algumas de taipa, outras até de concreto, mas sempre de muros meio abertos dando passagem para os quintais que emendavam pequenos terreiros com criações de animais.

Ficou na parte baiana da família a pacata vida de vilarejo, os cordões umbilicais enterrados nas porteiras de sítios vendidos para a CHESF.

Para quem não tem o privilégio de conhecer a localidade em questão, mais precisamente, o submédio São Francisco, Petrolândia está localizada às margens do lago de Itaparica. Aproximando-se pela BR 316 após o município de Tacaratu, avista-se a Igreja do Sagrado coração de Jesus que ainda se acha de pé desde a inundação da cidade, parcialmente submersa. Tratava-se da Igreja da área rural do município, conhecida como Barreiras. Até os dias de hoje o atual projeto de irrigação Apolônio Sales é chamado pela população como Barreiras fazendo referência ao antigo lugar.

Aqui temos um símbolo. Símbolos carregam valores culturais passados historicamente por gerações, povos, nações, organizações. A cultura propriamente dita é o conjunto de construções identitárias de populações diversas. Nela cabe arte, arquitetura, costumes, comidas. Cabe sentimento.

Conjuntos simbólicos podem e são usados e apropriados como atrativos turísticos. O turismo por sua vez faz parte do terceiro setor da economia aquele que engloba comércio e serviços. Unindo um ao outro, temos uma atividade de interesse comunitário. Concordamos?

No entanto, a premissa da palavra sustentabilidade passa pelo ato de auto sustentar-se. Percebe? Repita comigo: “AUTO SUSTENTAÇÃO”. O turismo sem sustentabilidade não existe razão de ser e ele tem data de validade. Assim, como as praias degradadas no litoral norte, assim como os corais de Maracaípe, assim como a duna de areia da nossa amada e bela Ilha de Rarrá que praticamente não existe mais depois de tantas visitações com escorregões em grupo indiscriminadamente, sem aviso, sem orientações, sem educação ambiental.

Para servir ao turista, o turismo precisa servir à população local. Para servir à população local é preciso que o povo conheça sua história. É inconcebível que conhecendo sua história, os filhos de Petrolândia compactuem, achem normal e de bom tom que o ÚNICO patrimônio do antigo município (submerso de forma tão violenta em vários aspectos) seja usado da forma que foi no último final de semana (19 e 20 de setembro de 2020) com utilização de alto som (que prejudica não só fundações construídas, mas afeta animais), luzes montadas em uma estrutura que resiste bravamente e não sabemos até quando, e fogos de artifício lançados pelos seus espaços vazios de concreto mas cheios de tanto valor afetivo para nós.

Gostaria de fazer um convite à reflexão sobre qual tipo de turismo queremos oferecer e por quanto tempo? Nossa história não tem validade, ela tem um valor imensurável para quem viveu e para quem viverá a história de Petrolândia. Um povo sem memória é um povo sem história, sem identidade.

 

Milena Barros Gomes

Gestora de turismo, Geógrafa, mestra em Desenvolvimento e Meio Ambiente.


Em anexo, para apreciação de toda a propaganda do Governo do estado de Pernambuco, feita em 2019, onde a Igreja é exibida corretamente, sem causar danos à sua estrutura: 

10 comentários:

  1. Excelente reflexão! Uma aula e tanto sobre pertencimento. Fico muito feliz em ver esse movimento tomando corpo nas novas gerações de petrolandenses, que saindo para estudar, tiveram oportunidade de enxergar a importância de cuidar da nossa identidade. Parabéns, Milena, pelo belo texto!

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  2. Espetáculo, de verdade, é esse texto!!!!
    👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼

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  3. Parabéns Milena. Excelente argumento reflexivo que certamente marcam a veadeira consciência de um povo diferente. E mais ainda, classifica a razão de muitas novas gerações ainda não se encontrarem na admissibilidade da consciência e sabedoria ambiental, em principalmente saber o que é a verdeira premissa de "Sustentabilidade". Estamos numa geração de ideologias e pouco conhecimento da historia de tantos marcos deixado pela remanescência de um povo. Estamos a cada tempo, assistindo faltar a educação de valores, famílias e historias que certamente passamos por uma educação de que o serviçal imediatismos e lucrativo é mais importante. Perdemos de fato tantas boas sustentabilidades para um povo construir com o respeito a natureza com educação ambiental. Lamentável aos nossos atuais princípios de comportamento de um povo que veio de uma remanescência ordeira. Bom dia. Sou apenas um observador, não tenho titulo, mais uma força de observação por essa terra.

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  4. Site menina o telinha, culta é defensora principalmente dos amigos.
    tão fiel aos amigos, que sempre será contra a qualquer ideia ou projeto da própria mãe. insistentemente ela é Daniel a tem nessa tecla a dias. Pra vcs 👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼.
    só uma coisa p vcs . O ORACAO DE DEUS E A HISTÓRIA NAO SE TEDUME A ESSA RUÍNA.
    HIPOCRISIA E NECESSIDADE DE APARECER.
    TRISTE E PATÉTICO

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  5. conversando os erros : essa menina é muito culta e defende acima de tudo seus amigos. ACIMA PRINCIPALMENTE DA MÃE. Deixa eu lembrar uma coisa ... o coração de DEUS não está as ruínas da igreja e muito menos a estória de seu povo. insistentemente postando a vários dias algo lindo q foi feito com toda segurança
    patético, ridículo.

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  6. Parabéns por sua postagem, fico triste em saber que a igreja onde eu me batizei não está sendo bem cuidada tomara que o governo tenha mais cuidado com esse patrimônio.

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  7. Desde o pequeno e grandes tragédia que vem acontecendo isso ainda é pouco, como citado no texto, uma violação a história centenária de uma cidade que deveria ser preseeda.
    Os seres humanos (homem) são oportunistas que só pensa no dinheiro ou status e assim vivem a destruí tudo.
    Vi essa "festinha" rolando nas redes sociais, não sei como as paredes resistiu ao som estrondoso,um absurdo.

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  8. Desde o pequeno e grandes tragédia que vem acontecendo isso ainda é pouco, como citado no texto, uma violação a história centenária de uma cidade que deveria ser preseeda.
    Os seres humanos (homem) são oportunistas que só pensa no dinheiro ou status e assim vivem a destruí tudo.
    Vi essa "festinha" rolando nas redes sociais, não sei como as paredes resistiu ao som estrondoso,um absurdo.

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