Foto: Daniel Filho |
“É preciso dizer a nossos filhos e netos
o que nós sofríamos antigamente. O pouco de comida que se fazia muita, como ralar
um quilo de feijão para alimentar oito filhos por uma semana(...). Hoje o jovem
não sabe o que conquistou e fica a mercê da mídia com jornais tendenciosos
fazendo deles massa de manobra. Quem vai ensinar a eles? Nós... Ou nós
ensinamos ou a Globo ensina”
Foto: Daniel Filho |
Declaração emblemática de Edinaldo Ramalho,
mais conhecido como Neguinho, coordenador regional do Movimento dos Sem Terra
(MST). O debate no Encontro da Juventude no assentamento Canaã, município de
Tacaratu, tinha em seu teor a preocupação da educação política de nossos jovens.
Afinal o que aprendem nossas crianças e jovens nas escolas que as tornam tão
facilmente manipuladas por canais de tv e mídia em geral?
Tive a oportunidade de falar a mais de
setenta (70) participantes, entre adultos, jovens e crianças sobre o papel que
deve ter uma educação verdadeiramente formadora. Mas ela existe?
Foto: acervo |
Somos ensinados e, posteriormente, passamos a
ensinar, que a educação é imparcial e, desde seu plano político pedagógico, sua
estrutura é organizada para possibilitar a formação cidadã plena do estudante.
De acordo com alguns que a fazem o foco “sempre
será o estudante”.
E por que falha? Ou, se não falha, por que é senso
comum a frase: “Esses alunos não querem nada com a vida”?
Porque vivemos uma educação que mente.
Essa precisa de muito investimento para se manter
bem maquiada. Porém não importa quantos laboratórios de informática, ciências
ou recursos tecnológicos a escola disponha ou venha a dispor, você certamente
irá ouvir:
“...esses alunos não querem nada com a vida!”.
Afinal a culpa quando não é do sistema é do
aluno, não?
Na escola de mentira o professor é, gradativa
e “imparcialmente” convencido de que aquele sentimento inicial, ser possível
mudar o mundo a partir da educação, é devaneio:
“Eu era assim como você... Empolgado,
lutador. Mas em breve você, assim como eu, terá desgosto da educação e verá que
tudo que aprendemos em pedagogia só é possível no papel. Na realidade é bem
diferente”.
E dali em diante atos e condições garantirão
que o professor cumpra sua sentença. De forma passiva, ele deverá se revoltar e chorar
suas mágoas na sala dos professores ou nos encontros de (de)formações continuadas. Essas virão
para revalidar a mentira. Travestirão como terapeuta o (de)formador que
estará ali para ouvir as angústias docentes. Chorando solidariamente junto ao
professor, lembrará que:
“...as coisas são assim porque são. Você
não pode mudar o mundo”.
Mentes docentes serão forjadas, indecentemente, a entender que:
“Ideal é legal, mas vai atrapalhar sua
carreira. Você é uma pessoa inteligente, não precisa disso para se dar bem na
vida.”
E vemos surgir a mentira na educação. A
partir daqui, crianças e jovens também serão direcionados a não gostar de política,
consequentemente não ousarem a se organizarem coletivamente e criar um Grêmio estudantil que “atrapalhe
a escola”. E a tal imparcialidade educacional toma um partido pior:
converter a juventude à passividade de que “as coisas são assim...”.
Minhas palavras não são para apontar
culpados, mas para mostrar quem são as vítimas. Mesmo alguns dos que fazem, coordenam,
a educação, são vítimas. Os que, em nome de uma ufania, são militarizados a “garantir
segurança e ordem”, são vítimas da educação de mentira.
Dos assassinatos de nomes como Mahatma
Gandhi, Chico Mendes, irmã Dorothy, à dizimação de Canudos, passando pelos vinte
e um (21) integrantes do Movimento dos Sem Terra (MST) massacrados em Eldorado
dos Carajás, estado do Pará, em 17 de Abril de 1996, pela Polícia Militar do estado,
podemos chegar ao processo de reintegração de posse em Petrolândia que despejou
à própria sorte diversas famílias em frente ao ginásio de esportes do município
em 2013, todos os massacres são decorrentes dessa estrutura que mente tão bem.
(Como? Sua escola não te ensinou a
contextualizar a história com o seu presente local? Deve ser a imparcialidade
da educação...). As imagens a seguir contextualizam:
Canudos. Povo vítima do descaso público e por ele massacrado... |
...Petrolândia. Moradores despejados à própria sorte.Foto: Jair Ferraz. |
A educação da mentira ensina ainda a odiar. Odiar o
que luta, pois esse é marginal. Baderneiro. A educação que mente não ensina que amor e luta são sinônimos.
Ela ensina ainda a
fantástica fórmula do que é VENCER NA VIDA.
ESTUDAR PARA "SER ALGUÉM NA VIDA"
Crianças e jovens, sob a tutela da tal
“educação imparcial”, aprende que vencer na vida é sair de suas raízes para conquistar
ascensão financeira fora. Aprende que venceu na vida aquele profissional que
alcança altos salários e volta à sua cidade de origem para “passar as férias”
em vez de trabalhar o que aprendeu para o desenvolvimento do seu local de
origem.
Foto: Acervo |
Mas essa meritocracia ainda é para poucos e a
educação de mentira sabe que não pode se sustentar mentira com minoria, então
ela engana ainda mais. Ela consegue convencer aos que não conseguiram estudar
fora, muito menos ficarem ricos, que podem ser honrados com o que aprendeu na
escola. Basta aceitarem as condições que a vida (leia-se os cidadãos políticos
dominantes) ofertar sem se rebelar.
Farão acreditar, independente do esforço
daqueles jovens que não dormem em berço esplêndido, que ele se esforçou pouco.
Que as oportunidades são iguais para todos, e o esforço é a única linha a
definir as fronteiras dos VITORIOSOS e DERROTADOS. Venceram os ricos, perderam
os ditos marginais, serviram a ambos os que honraram a passividade apregoada
pela educação “imparcial”.
E Paulo Freire? Para a educação da mentira
está ultrapassado. Representa a doutrinação comunista de nossas crianças e
jovens.
E A
EDUCAÇÃO DE VERDADE?
Essa existe, mas é subestimada, afinal é
formada por pessoas invisíveis. A fraca estrutura dos prédios, a ausência dos
recursos tecnológicos e a distância dos centros urbanos que “salvam” a
juventude, força a educação de mentira a fechar os olhos para o que é real.
Na educação do campo Paulo Freire é honrado,
das falas à prática. A criança e o jovem, desde cedo, se reconhece campesino e
tem sua individualidade convertida ao coletivo. Ele sairá do seu meio para se
formar tecnicamente, com o sentimento de que precisa voltar para contribuir
para a vida dos que ficaram.
O professor aprende ensinando. O aluno ensina
aprendendo.
É preciso que juventude rural estreite os
laços com a juventude urbana (fronteiras essas criadas pelas educação da
mentira) para que se percebam em suas diferenças e pontos em comum por uma educação
que não defina quem pode ou não vencer na vida, mas que qualifique a todos a
compreender e poder fazer que a única vitória possível é a que inclui
socialmente a todos.
As discussões terão continuidade em diversos
encontros organizados pelo Movimento dos Sem Terra (MST) estando previstos
encontros nos assentamentos Antônio Conselheiro e Papagaio para, enfim, um encontro
entre todas as comunidades em dois dias de formação e confraternização em data
e local que ainda serão definidos.
As fotos abaixo foram do encontro no assentamento Canaã, município de Tacaratu. Encontro acontecido no último sábado (29).
Excelente mais uma vez, professor. É realmente triste ver a descrença na "Educação de verdade", já que ela é a única que muda. Mas desistir é para os fracos! Vou voltar para a minha terra e contribuir com o crescimento dela. Sem mais.
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