Secretário de Assuntos
Fundiários, Nabhan Garcia chamou as escolas do movimento de "fabriquinhas de ditadores"
Mauro Ramos
Brasil de Fato
Filhos de trabalhadores rurais sem-terra no estado de Alagoas / MST | AL
O
secretário especial de Assuntos Fundiários, Luiz Antônio Nabhan Garcia, afirmou
que pretende fechar as escolas do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), chamando-as de “fabriquinhas
de ditadores”. Em entrevista à
revista Veja, Nabhan Garcia
disse que o movimento de luta pela reforma agrária é uma “organização criminosa” e
defendeu o direito de os fazendeiros utilizarem armas de fogo quando
tiverem propriedades improdutivas ocupadas.
Segundo a assessoria de
imprensa do MST, cerca de 1,5 mil escolas do movimento são responsáveis
pela educação de crianças e jovens de 7 a 14 anos. Destas, 1,1 mil são
reconhecidas pelos conselhos estaduais de educação e cultura.
Presidente
da União Democrática Ruralista (UDR), vinculada
ao patronato rural, Nabhan Garcia é conhecido por apoiar o desmatamento da
Amazônia. Ele também teve que depôr à Comissão Parlamentar
Mista de Inquérito (CPMI) da Terra por porte ilegal de armas, contrabando e
organização de milícias privadas na região do Pontal do Paranapanema, em São
Paulo. A UDR, por sua vez, tem sido questionada pelo MST e por intelectuais
brasileiros desde a sua formação. No livro A Nova Direita - aparelhos de ação
política e ideológica no Brasil contemporâneo,
Flávio Henrique Calheiros menciona a UDR como um dos "aparelhos
organizativos da burguesia brasileira".
O autor afirma que, durante
Assembleia Constituinte, em 1987, a organização “atacou de forma veemente o
trecho da proposta da Constituição referente aos direitos sociais”.
Integrante
da direção nacional do MST, Kelli Mafort conversou com o Brasil de Fato e
respondeu às declarações do funcionário do Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento: “Nabhan tem que responder como a
regularização fundiária da sua secretaria vai atuar diante do grave problema da
fome e da miséria no país. O MST e a luta popular têm resposta direta e simples
para tal problema: acabar com os privilégios do agronegócio e sua verdadeira
mamata de sonegação fiscal e incentivos do Estado. Fazer reforma agrária, com
moradia, trabalho e direito à alimentação, educação e cultura para milhares de
sem-terra”.
Em relação aos privilégios denunciados
por Mafort, Nabhan se solidarizou com o agronegócio ao afirmar que “está
havendo uma cobrança muita alta para a propriedade ser considerada produtiva”.
Ainda sobre o assunto, declarou que o apoio do governo, como os programas
de refinanciamento de dívidas, “é para quem trabalha e produz”.
Nabhan
tem articulado, junto ao governo Bolsonaro (PSL), o perdão das
dívidas de empresários ruralistas com o Estado, que somam R$ 17 bilhões.
Ao ser consultado sobre o seu posicionamento em relação ao Programa de
Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), afirmou à Veja: “Agricultura
familiar não é minha área, mas sou contra o programa. Dinheiro público não é
para ser jogado na lata do lixo”.
Escolas
do MST
Mais de 200 mil estudantes
têm acesso à educação graças ao MST. As escolas somam cerca de 4
mil professores, além de 250 educadores que trabalham nas Cirandas
Infantis – onde é realizada a educação de crianças de até seis anos ou na
faixa da alfabetização. São 320 cursos divididos em 40 instituições de nível
fundamental, médio, técnico, superior e educação de jovens e adultos (EJA).
A auto-organização do
movimento permitiu que mais de 20 mil pessoas fossem alfabetizadas no
Maranhão, estado com a terceira maior taxa de analfabetismo no país.
As
aulas do programa "Sim, eu posso", inspiradas no método
cubano de alfabetização, são oferecidas em 15 municípios com os menores Índices
de Desenvolvimento Humano (IDH) do estado.
Segundo
o Índice de Desenvolvimento na
Educação Básica (IDEB), duas escolas do MST no Piauí obtiveram
em 2018 os maiores índices na educação
básica.
O IDEB foi criado em
2007 pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira (Inep). Segundo informações do portal do Ministério da Educação, ele
funciona como um indicador nacional que possibilita o monitoramento da
qualidade da educação pela população.
Meio
ambiente
Nabhan
especula que a Terra Indígena Raposa Serra do Sol possa ter
sido demarcada com base em “estudos ideológicos, estudos
tendenciosos”: “Você sabe que está cheio de laudo antropológico falso, que
há atuação de ONGs com interesses escusos, que há atividades econômicas
clandestinas em várias áreas indígenas”. O secretário afirma que o
governo está trabalhando para encontrar “falhas, erros e procedimentos
que fogem dos princípios legais”, para revisar a demarcação.
Apologia
ao crime
Nabhan
defende assassinatos de camponeses sem-terra – segundo ele, em
legítima defesa: "Às vezes, o fazendeiro, na iminência de ser morto, de ver um
filho assassinado ou ter a sede da propriedade queimada, vai lá e mata um
sem-terra. O que acontece no outro dia? O sujeito que morreu vira mártir, e o
que atirou passa a ser o vilão, vira réu, pega 30 anos de prisão. Está tudo
invertido".
Para
Mafort, a declaração expressa “a violência do latifúndio, que se vale da
impunidade como forma de continuar perseguindo, torturando e
assassinando". A dirigente prossegue: "São as mãos dos
latifundiários que estão manchadas do sangue de Irmã Dorothy, Chico Mendes, Oziel Alves e seus companheiros
massacrados em Eldorado dos Carajás. Crimes investigados, e alguns
impunes, mas todos com as digitais do legado da UDR. Nenhum desses lutadores
tentou matar um fazendeiro. Isso é falácia, verborreia de secretário que tenta
emplacar fake news sobre
vidas ceifadas por criminosos e seus mandantes. E com a suposta modernização do
agronegócio, os crimes continuam sendo cometidos, como demonstra a recente condenação da empresa Syngenta
pelo assassinato de Keno, militante do MST no estado do
Paraná".
"Nabhan, seus comparsas da UDR e
do latifúndio já foram derrotados na década de 90 pelo MST e pela sociedade.
Muitos assentamentos foram feitos a partir da luta popular, e em cumprimento constitucional
da função social da terra. Não será tarefa fácil, mas certamente derrotaremos
mais uma vez essas teses arcaicas de Nabhan, com a luta e a organização
popular", finaliza a dirigente nacional do MST.
Edição: Daniel
Giovanaz
Fonte: Brasil de Fato - https://www.brasildefato.com.br/2019/01/16/alvo-de-secretario-ruralista-escolas-do-mst-sao-referencia-na-alfabetizacao-no-campo/
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