Blog Gota d'Água: PETROLÂNDIA: DE POTENCIAL TURÍSTICO À QUINTAL DE RICO COM AVAL DO PODER PÚBLICO LOCAL

Imagens: reprodução internet

Petrolândia, sertão de Pernambuco, tem um reconhecido potencial turístico que atrai pessoas de todo país. Rodrigo Novaes (PSD), secretário de turismo do estado, não poupa com campanhas publicitárias que enaltecem nossas belezas ricas em história, sendo a igreja do Sagrado Coração de Jesus, “a igreja submersa”, certamente o ponto que mais atrai atenção e polêmicas.

Inundada em 1987 para a construção da Hidrelétrica Luiz Gonzaga, a estrutura permaneceu em pé e se tornou mais que um ponto turístico por estar submersa, mas um marco temporal a representar a memória das comunidades locais (Barreiras, Petrolândia…). Desde então há a preocupação pela manutenção de sua estrutura e, para isso, cuidados são necessários para que as ruínas não desabem completamente levando, finalmente para o fundo do lago, a última estrutura que liga passado e presente dos moradores.

Para isso o Instituto Geográfico e Historiográfico (IGH) de Petrolândia, grupo organizado com a missão de preservar a memória da cidade, presidido por Paula Francinete, vem defendendo e conquistando instrumentos de proteção ao patrimônio como o pedido de tombamento acatado pela Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (FUNDARPE).

A publicação no Diário Oficial em 12 de Janeiro de 2021 deu início ao andamento oficial para transformar as ruínas em patrimônio histórico, com isso o local já passa a ser parte da lista de espaços preservados e não pode mais sofrer alterações ou destruição em sua estrutura.

O protocolo registrado em novembro de 2020 foi motivado por conta da participação do DJ Bhaskar para uma apresentação musical de quase quatro horas de duração realizada no local em setembro de 2020 (você pode assistir clicando no link ao final do artigo. O som alto, o uso de fogos de artifício e a estrutura montada para a realização do evento dividiu opiniões. Muitos consideraram que a atividade traria ainda mais visibilidade e investimentos para impulsionar de vez o turismo local, a grande maioria se revoltou por compreender que a estrutura não está sendo protegida como deveria e a apresentação favorece para acelerar a depreciação. Essa grande maioria participou de um abaixo-assinado incluído na solicitação de tombamento apresentada pelo IGH.

NOVA GESTÃO, VELHA HISTÓRIA

A nova polêmica aconteceu no último final de semana, 6 de Novembro, com a realização do 5° Encontro de Jet Ski promovida pelo “Jetclub Petrolândia”. Como mostram as imagens os participantes promoveram ainda mais agravo à já abalada edificação com som alto e estrutura de palco montada junto às ruínas e dezenas de Jet-skis e barcos circulando por dentro e fora da igreja.

A peça publicitária já previa a visita

à igreja submersa

em seu roteiro divulgado

com antecedência

Absolutamente nenhum tipo de fiscalização e, até o momento, nenhuma nota oficial da prefeitura, vereadores, secretários acerca do claro descumprimento ao protocolo aberto pela Fundarpe. A prefeitura não pode alegar que não sabia que a igreja fazia parte do roteiro, pois os cards publicitários promocionais apontavam o ponto como parte do roteiro.

A única aparição de agente público falando sobre o evento se deu de forma inusitada. O vice-prefeito Rogério Novaes (PSD) gravou um vídeo declarando ter sido impedido de entrar no evento por ser privado, ainda que acontecendo em local público:

“(…) ruim mesmo, pra mim, seria o apagar da nossa história. SE RESPEITEM. Façam a farrinha, o torneiozinho... o sei lá o quê que quiserem, mas SE ENXERGUEM, o que vocês ganham amarrando um palco no último patrimônio de pé do antigo município? Um lago tão grande? Isso é pra aparecer? Vale a pena? Vocês precisam disso? Pois saibam que é crime. Eu espero muito que a Prefeitura tome providências porque eu mesma já estou tomando. A FUNDARPE e o ministério público estarão cientes esta semana ainda.”

Declarou Milena Gomes, geógrafa e membra do IGH, em artigo publicado aqui em nosso blog que pode ser conferido no link ao final da matéria.

Advogados se ofereceram para auxiliar o Instituto e ainda essa semana será protocolada denúncia junto ao Ministério Público e Fundarpe para apurar e punir os responsáveis.

TURISMO OU QUINTAL DE RICO?

“O evento (encontro de Jet-ski) foi privado, não tem nada a ver com a prefeitura!”, argumentam alguns. Então é isso? Quem tem dinheiro chega, manda fechar e pronto? Não necessita de ofício e autorização da prefeitura para realização de eventos privados em espaços públicos? Até onde vai a defesa de um turismo que beneficia dúzias em detrimento de milhares?

Muito se debate sobre a quem compete o desenvolvimento do turismo em um município. Será melhor o poder público junto ao conselho de turismo tomar a frente? Somente o setor privado? Preciso ser misto? Petrolândia vem provando que, se depender tanto dos agentes políticos quanto dos empresários, não apenas o turismo, mas todos os patrimônios que restam irão para o lixo.

A omissão (ou conivência?) é geral desde gestões anteriores e parece que irá permanecer. Vereadores não fazem atualização da lei orgânica e plano diretor, consequentemente, não se regularizam as titularidades da terra e “donos” de espaços públicos vão tomando posse e mudando como bem entender.

Executivo e legislativo faz vista grossa a empresário que cerca área ambiental, que bloqueia acesso publico para cobrança de entrada, dezenas de crimes ambientais e contra patrimônios tombados ou em processo de tombamento... O descaso segue a céu aberto. Os que criticam e cobram ação dos poderes públicos são atacados. Os que deveriam ser responsabilizados ganham salvo conduto para continuar a destruir.

A Petrolândia que outrora lutou bravamente para reduzir danos com a transposição da cidade em plena ditadura militar, parece, agora, estar sonolenta a assistir a destruição de seu meio, lazer e memória. O problema é que o mau ressona, mas não dorme e quando os bons, enfim acordarem, poderá ser tarde demais.

Matéria e artigo por Daniel Filho