terça-feira, 16 de novembro de 2021

TURISMO E PAISAGENS SERTANEJAS – AS OPORTUNIDADES NA REGIÃO DOS LAGOS E CÂNIONS DO RIO SÃO FRANCISCO

 

Imagens: arquivo


É tão grande a quantidade de atrativos e as opções de turismo nesta nossa Região dos Lagos e Cânions do rio São Francisco, foco da minha defesa de Mestrado em Portugal, que vale a pena dizer mais que duas palavras sobre eles. Tantos são que, ao apresentar essa defesa de Mestrado em Lisboa, em 25 de novembro de 2005, há 16 anos, o meu arguidor, o Professor Doutor Xavier, do Curso de Doutorado em Turismo de Portugal me disse ao final da minha apresentação: “Parabéns, Professor. Eu só não entendo como vocês têm tanto e não têm nada”.

Obviamente que ele se referia à falta de visão dos empresários e dos gestores desta região para a exploração, de forma preservadora desse riquíssimo tesouro e, de lá para cá, alguma coisa aconteceu. Pelo menos na região de Xingó e também começam a ser anunciadas algumas opções de turismo em Delmiro Gouveia, Piranhas, Petrolândia...

Embora a atividade de movimentação de pessoas para fins de lazer ou negócios, conhecida como turismo, exista no mundo há mais de 4 mil anos e haja exemplos de várias modalidades de turismo na Europa e no Velho Mundo, há séculos, no Brasil esta atividade é muito nova. O primeiro curso universitário de turismo no Brasil só foi criado em 1970. Foi a Faculdade de Turismo do Morumbi.

A visita do Imperador D. Pedro II à Cachoeira de Paulo Afonso, em outubro de 1859, há 162 anos é o fato mais marcante na região banhada pelo rio São Francisco nas terras da Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe.

Em 2009 se fez a experiência da retomada dessa Rota do Imperador, mas a ideia não teve desdobramentos.

E, há lugares em que a falta de cuidado com patrimônios naturais, arquitetônicos, históricos pode, infelizmente, levar à perda desse patrimônio...

Enquanto na Europa igrejas, ruínas, construções milenares, como o Coliseu, de Roma, por exemplo, são preservadas e atraem milhões de visitantes para conhecê-las, no Brasil, mormente em cidades do interior dos Estados, há um abandono desses ricos patrimônios de que se aproveitam outros para, aos poucos, os destruírem ou, distorcer a imagem para a qual foram construídos.

Desses patrimônios, um destaque são os templos religiosos, construídos em todo o mundo em lugares elevados, nos centros de grandes praças e com um cuidado nos seus detalhes, nas suas paredes, nas suas torres e colunas, nos vitrais que os embelezam, que enchem os olhos de qualquer visitante. Uma igreja, mesmo em ruínas, é sempre um lugar de reflexão.

Em duas viagens que fiz a Portugal quando defendia minha tese de mestrado sobre o Turismo Sustentável na Região dos Lagos do rio São Francisco, tive a oportunidade de, em uma delas, visitar a Catedral de São Pedro ou Catedral de Genebra, da cidade de Genebra, Suíça, que está situada no centro histórico, foi inaugurada em 1.150, com uma mistura da Arquitetura gótica, românica e neoclássica e é, desde 1535, a principal igreja protestante da cidade.

Além da impressionante construção apoiada em vigorosas colunas e a estrutura e beleza de suas naves, dos seus vitrais, duas outras coisas chamaram a nossa atenção: o silêncio e o respeito dos visitantes que ali chegavam e a preservação, em área de destaque, de um uma tosca escrivaninha e uma cadeira que foram utilizadas pelo reformador protestante João Calvino.

Um detalhe: para se subir nas suas torres, paga-se uma taxa. E todos querem fazer isso porque a vista panorâmica da cidade é igualmente impressionante.

Fiz essa referência porque na Região dos Lagos do rio São Francisco, as águas dos lagos de Moxotó afogaram a história, a vida e todo o patrimônio da centenária cidade de Glória, do Povoado Barra e muitos quilômetros de terras da Bahia.

Assim também, os 11 bilhões de metros cúbicos de águas da Barragem de Itaparica inundaram todas as terras agricultáveis de Petrolândia, cemitérios, as casas da centenária cidade, o rico patrimônio histórico, cultural e arquitetônico, dentre estes, a Igreja do Sagrado Coração de Jesus, desta cidade, no Sertão de Pernambuco.

As ruínas desta Igreja, no meio do Lago de Itaparica, têm merecido a atenção das pessoas e o seu uso desordenado para vários fins, tem preocupado o Instituto Geográfico e Histórico do Município de Petrolândia que vem, há tempo, lutando pelo tombamento desse patrimônio e pela adoção de medidas que aproveitem esse rico patrimônio para fins do turismo sem, no entanto, prejudicar a sua estrutura ou distorcer o seu uso para fins não condizentes com aqueles para os quais essa edificação foi criada.

A construção exótica do edifício tem atraído os olhares de moradores locais e de outros de outras regiões.

Ali já se fez ensaios fotográficos para noivos. Há algum tempo promoveu-se a gravação de um clipe, o que, para muitos, foi uma forma de desrespeito ao local o que gerou, dentre outras ações, o pedido de tombamento desse patrimônio feito pelo IGH/Petrolândia.

No fim de novembro de 2020, o Instituto Geográfico e Histórico de Petrolândia (IGH), entidade que busca preservar a memória da cidade, protocolou o pedido de tombamento junto à Fundarpe. A iniciativa contou com um abaixo assinado que recolheu mais de mil assinaturas. Em publicação na edição do dia 12/01/2021 do Diário Oficial do Estado, a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) deferiu a proposta de tombamento das ruínas da Igreja do Sagrado Coração de Jesus, em Petrolândia, no Sertão de Pernambuco.” Diz o jornal Folha de Pernambuco em sua edição de 12 de janeiro de 2021.

Paula Rubens, presidente do IGH, diz: “O mundo todo quer visitar e queremos muito isso. Entendemos que a cidade pode ter essa vocação ao turismo, mas queremos um turismo responsável. Esperamos muito tempo achando que estava ali de certa forma protegida, o pessoal que transporta também tem interesse que seja preservada. O cenário é muito bonito, tem muita gente fazendo ensaio fotográfico, mas queremos que a Fundarpe envie seus técnicos. Podemos fazer 10 visitas por dia, 20 vai complicar, por exemplo”, completou a presidente do IGH.

Sobre o pedido de tombamento das ruínas da Igreja, diz a presidente do IGH: “O pedido foi protocolado no final de novembro, após o uso do espaço para a gravação de um clip do DJ Bhaskar, irmão gêmeo do também DJ Alok. O show provocou revolta na cidade de 37 mil habitantes.”

Diz o jornal Folha de Pernambuco que “Segundo a Fundarpe, quando há um pedido de tombamento, existe um processo inicial chamado de tombamento prévio. Quando há o deferimento, como o da igreja de Petrolândia, o bem passa a compor o rol de patrimônios tombados no Estado. A partir da publicação no Diário Oficial, ressalta a Fundarpe, o 'bem já se encontra protegido legalmente contra destruição e/ou descaracterizações até que haja a homologação do tombamento com inscrição no Livro do Tombo específico e averbação em cartório de registro de imóveis onde esse bem estiver registrado'". Não há um prazo específico para a finalização do processo.

No início o mês de novembro de 2021, o assunto voltou a ocupar as redes sociais quando Milena Gomes que é Geógrafa, Mestra em Desenvolvimento e Meio Ambiente e membro do Instituto Geográfico e Histórico (IGH) de Petrolândia que lutou e conquistou, por lei, o tombamento e preservação da Igreja do Sagrado Coração de Jesus, publicou uma nota bastante revoltada no Blog Gota D`Água quando moradores de Petrolândia amarraram um palco na estrutura destas ruinas, em processo de tombamento.

Em sua nota, a geógrafa diz: “Não vou fazer juízo de valor em cima do lazer alheio, longe de mim. Mas olha, um conhecimento básico do próprio lugar e um pouco de noção são recomendados a quem tem tanta "pose", não? Nem like no Instagram vai dar pra angariar se a igreja cair. Pior, a gente perde o caminhar da atividade turística se perder o principal cartão postal do município. Agora ruim mesmo, pra mim, seria o apagar da nossa história.”

E conclui: “Façam a farrinha, o torneiozinho... o sei lá o quê que quiserem, mas SE ENXERGUEM, o que vocês ganham amarrando um palco no último patrimônio de pé do antigo município? Um lago tão grande? Isso é pra aparecer? Vale a pena? Vocês precisam disso?

Pois saibam que é crime. Eu espero muito que a Prefeitura tome providências porque eu mesma já estou tomando. A FUNDARPE e o ministério público estarão cientes esta semana ainda”.

Em outros lugares, no Brasil e em outros países, há até o cuidado de se proteger patrimônios inundados. Por ali, todo o cuidado sempre parece pouco, como é o caso de Itá, uma cidade submersa na divisa do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, cuja igreja, inundada com a cidade, mereceu um cuidado especial para sua proteção e se tornou ponto turístico.

Enquanto isso, em outras terras brasileiras, nos sertões nordestinos, as ações de proteção a esses tesouros quase sempre são lentas e às vezes chegam tão atrasadas que se tornam desnecessárias porque o objeto a ser protegido nem existe mais...


publicado em https://www.folhasertaneja.com.br/noticias/paisagens-sertanejas/588757/1

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